O Diário de Myriam
Literatura,  Resenhas

O Diário de Myriam | Um relato difícil e urgente sobre a guerra sob o olhar de uma criança

Alguns livros nos passam uma primeira impressão de leitura fácil. As páginas, poucas, são acompanhadas de espaçamentos generosos e, olha só, tem até imagens. ‘Vou ler isso aqui em dois dias’, pensou Isabella. Só que não, queridinha. O Diário de Myriam pode ser visualmente atrativo, mas seu conteúdo profundo, necessário, urgente, pede sua atenção e dedicação. Atenção esta que, apesar de ter sido parcelada, nunca me arrependerei de ter dado.

Myriam é mais uma criança perdida na guerra. A diferença dela para todas as outras é que seu diário ganhou vida. O moderno Diário de Anne Frank remonta um dos mais impactantes conflitos do século XXI através dos olhos da infância.

A Guerra da Síria já se estende por quase uma década e a situação dos refugiados gerou diversos conflitos na Europa. Continuar no próprio lar era um dos maiores desafios. Imagine a sua casa, aquele lugar para onde você reza para chegar depois de um longo dia de trabalho ou estudo, destruída. Ficar era ou um ato de muita coragem ou de muito desespero – ou os dois. A família de Myriam está entre os corajosos. Pensando bem, fugir de seu lar não é algo fácil de se fazer também. Viver em um mundo em guerra é por si só um ato de coragem. Compulsória, mas coragem de qualquer forma. Isso porque, muitas vezes, abandonar fisicamente a guerra não quer dizer que ela te deixe ir completamente.

O Diário de Myriam

A menina de catorze anos descreve com palavras infantis sentimentos muito adultos. Muitos deles, nenhum adulto deveria saber ou sentir em um mundo bom e justo, quanto mais uma criança. Myriam e muitos outras crianças sírias não tiveram escolha. Quando o governo do seu país batalhava forças religiosas invasoras, não havia calma ou paz. O que restava era o instinto de sobrevivência e a esperança.

“A guerra era a minha infância destruídas sob essas ruínas e fechada em uma caixinha.” p.43

Myriam descreve perdas de parentes e conhecidos, dias sem eletricidade ou água, destruições completas de ruas e bairros que antes eram uma vista tão conhecida. Passando pelas páginas, que começam em 2011 e se estendem até 2016, nós rezamos por Myriam e sua Alepo, nas situações difíceis de engolir mas de conhecimento necessário do seu Diário.

Este que muitos consideram o novo Diário de Anne Frank me fez questionar: e se Anne tivesse assistido os horrores da guerra pelo lado de fora? Pergunta sem cabimento, eu sei. Afinal, ela era judia e seria capturada pelos nazistas. Porém, fiquei pensando no processo de amadurecimento das duas meninas, uma quase livre das ameaças bélicas, mas confinada a um pequeno cômodo. Outra com todas as ruas a sua frente, mas aterrorizada por todos os estouros de armas e mísseis quase ininterruptos. Deixemos para lá porque, no final das contas, uma guerra é uma guerra e suas marcas são muito maiores do que suas divergências políticas. Suas marcas ecoam pelas crianças envolvidas injustamente, pelos pais que perdem seus filhos lutando nela, pelas casas, lares, que ficam em escombros e nas memórias do passado.

O Diário de Myriam

O Diário de Myriam não traz somente as palavras da menina. Além disso, nós leitores ganhamos a experiência de outras crianças, daqui no nosso país, ao ler sobre ela, depoimentos de envolvidos tanto com a guerra quanto com o processo editorial do livro publicado pela DarkSide Books e fotos de partir corações do estado da Síria atualmente. É um livro urgente, uma leitura difícil, mas modificadora de pontos de vistas, nos lembrando que é preciso valorizar o que há de bom no mundo, tolerar o que há de diferente e lutar pela prevalência da paz.

O Diário de Myriam - Informações Técnicas

 

 

Semana DarkSide Books

Apaixonada por música, cinema, moda e literatura, história mundial e andar de bicicleta. Sonha em ter muitos carimbos em seu passaporte.

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