Felicidade Por um Fio | Uma libertação dos cachos e da própria consciência

Em inglês, há um ditado ou referência popular – não saberia te informar ao certo – que diz assim: “mother knows best”. Traduzindo-o, nós ganhamos algo como ‘mães sabem o que é melhor’. Para a mãe de Violet Jones (Sanaa Lathan), Pauletta (Lynn Whitfield), o melhor para sua filha estava em alisar os cabelos crespos de sua filha. Só assim, a imagem correta de quem ela era seria passada. A aparência seria a porta do sucesso para sua filha. Sucesso esse que, quando alcançado, teria que ser superado por um casamento pomposo, com um homem de profissão respeitável.

Violet cresceu vivendo na bolha da perfeição. Agora, ela é uma publicitária de cosméticos de sucesso, namora um médico cirurgião super gato, tem uma casa dos sonhos e os cabelos lisos mais bem cuidados de toda a cidade – quiçá dos Estados Unidos. O seu aniversário está se aproximando e ela tem certeza que seu namorado irá pedi-la em casamento. Quando, porém, o pedido não chega, ela entra numa fossa tremenda e comete a aparentemente pequena loucura de raspar seus amados cabelos em uma noite de bebedeira e decepções.

A manhã seguinte é marcada por mais que uma forte ressaca. Nossa protagonista embarca numa jornada de auto-conhecimento e aceitação que guiará a história de Felicidade Por um Fio.

O ponto zero

O movimento de transição capilar se tornou cada vez mais comum nos dias de hoje. Marcas de cosméticos que antes apoiavam o alisamento geral das nações, lançam agora produtos que buscam valorizar os fios que nascem com a gente. São dias de mudança… E isso é incrível. O olhar de Paulette sobre como a filha deveria ser influenciou a noção do que seria felicidade para Violet. O choque de um término que justamente recrimina esse olhar coloca tudo em xeque e somos nós, o público, que ganhamos com isso. Para Violet, no entanto, os primeiros passos do auto-descobrimento são bem tortuosos.

Com seus cabelos, vão embora a sensação de confiança, de maturidade e de força, a noção do que é certo e também seus planos para o futuro. Batem à sua porta, contudo, dúvidas e questões que podem levá-la a uma vida mais leve e, quem sabe, mais realizada. Raspar seus cabelos foi um ato de libertação. Aterrorizante, uma vez que vai contra o que a sociedade diz que é o correto para os cabelos de uma mulher, mas libertador. Violet encontra seu ponto de partida, seu ponto zero.

Duas noções do que é certo discutem na mente da protagonista: a visão com a qual foi criada, construída pela sociedade, aplicada pela sua mãe e acatada por ela já adulta, e a outra nascida graças às consequências da primeira. Um embate vivido por muitas de nós, mulheres, constantemente julgadas pela aparência, ao invés da essência. Trabalhado de forma leve, precisa, cuidadosa e necessária, Felicidade Por um Fio pode não ser o mais impactante filme sobre empoderamento feminino, mas com certeza é um dos mais fáceis de se relacionar.

As técnicas por trás da jornada

A partir daí, Felicidade Por um Fio faz juz ao nome. A busca pela felicidade é o motor do filme, mas definitivamente só dá certo porque Sanaa Lathan fez um trabalho brilhante. Sua Violet se transforma de superfície para profundidade e dá ao filme toda a carga emocional que o caminho para o empoderamento pode trazer.

O roteiro, contudo, colabora. A transição capilar de Violet mexe obviamente com a questão da sua identidade, e move as emoções de muitas cacheadas pelo mundo que estão assistindo o filme. Tina Gordon Grishim, Adam Brooks e Gina Prince-Bythewood, trio responsável pela adaptação do romance de Trisha Thomas, fizeram um ótimo trabalho em equilibrar o tom de comédia romântica com a ideia do empoderamento feminino.

Se antes eu nunca tinha ouvido falar do livro que originou o filme da Netflix, Haifaa al-Mansour e sua direção assertiva me fizeram encarar a história de Violet com muita atenção e curiosidade. Seu final, um tantinho aberto, aguçou esta última reação. E, se você também ficou curioso, Felicidade Por um Fio é baseado no primeiro livro da série Nappily, publicado em 2000. Infelizmente, não foi traduzido para português, mas quem sabe com o filme isso não mude?

A história de Violet pode não ser exatamente como a sua, mas com certeza inspira qualquer mudança. Por mais filmes de comédia romântica como este: atual, tocante e encorajador. 

Confira o trailer:

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