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Versailles: um sonho luxuoso banhado de sangue, política e veneno

Em 2006, Sofia Coppola dividiu a plateia de Cannes com os corredores de um palácio memorável e sua rainha desprezada e decapitada. Maria Antonieta chegou aos cinemas em tons pastéis, no ritmo “ame-o ou deixe-o”, e mostrava a ilusão luxuosa que Versailhes se tornou nos últimos dias do absolutismo francês. O que eu não sabia bem, contudo, foi como esse castelo surgiu. E é justamente isso, movido a drama, política, ambição e interesse, que nós descobrimos ao assistir a série francesa Versailles, que acompanha os momentos iniciais do mais longo reinado da França, o de Luís XIV, o Rei Sol.

A construção de Versailles: marco histórico ou tiro no pé?

As paredes do palácio vieram para o Rei Sol em um sonho. Em 1667, Luís XIV (George Blagden) dava início a construção de uma das mais belas construções do mundo, que tirou e deu vidas e transformou a corte francesa da época. Com o novo prédio, vinham novos costumes. Antes separada em suas terras, a corte foi obrigada a morar e conviver no mesmo lugar que o Rei e a seguir novas normas de etiqueta. Versailles foi concebido para ser o novo modelo, o novo exemplo, da mais perfeita corte europeia. Quando, na verdade, se tornou palco para as maiores estratégias corruptas da classe.

As três temporadas da série narram os movimentos políticos e pessoais de Luís XIV tão sol do drama quanto da época na vida real. Dentro do palácio, Luís precisava equilibrar uma corte entediada, decisões sobre a guerra contra a Holanda de Guilherme de Orange e seus interesses amorosos e familiares.

A primeira temporada procura construir a novidade que é Versailles. Por um momento, tudo é festa. Os nobres, apesar de ainda insatisfeitos por estarem fora de seus lares, parecem extasiados com toda a grandiosidade dos planos e obras do monarca. Ainda assim, os descontentes minam o governo de toda forma que podem e planos recheados de golpes, espiões e perseguições. 

As intrigas do novo palácio tem gosto de novela mexicana, só que mais mortífera e intrigante. A cada episódio a confiança de Luís XIV é testada e retestada e será preciso mais que os dez episódios iniciais para que o rei tenha certeza das lealdades verdadeiras. Até isso acontecer, contudo, Versailles derrama sangue e veneno, esbanja luxo e mentiras, viciando o público a cada novo capítulo.

Guerras são relativas

Os combates sangrentos da guerra no estrangeiro inundam Versailles tanto quanto o conflito dentro do próprio castelo. A segunda temporada veio para provar isso. Mais profunda que a primeira, com a construção mais estabelecida, a nova etapa da série trabalha temas mais intrínsecos ao novo estilo de vida. Uma comunidade super competitiva e gananciosa presa entre quatro (ou centenas, mas tão sufocantes quanto) paredes pode provocar a destruição do reinado de Luís de dentro para fora.

Uma onda de envenenamentos atiça o público e a segurança do rei e deixa a porta aberta para discussões sobre poder, religião e crescimento pessoal. Agora, Luís precisa curar sua corte doente a qualquer custo – mesmo que seja sua própria saúde. Qual seria o melhor remédio que enfrentar outra guerra? O encontro de Luís e Guilherme de Orange é um dos melhores episódios da temporada e dá um plot twist interno ao rei da França. 

O segredo de Versailles

Se o cenário é estonteante por si só, a estética não fica para trás. Bastante francesa, a série não tem medo de abusar dos elementos visuais que denotam mais subjetividade do que uma visão mais mecânica que as séries americana s costumam apresentar. O estilo enriquece Versailles tanto quanto suas paredes douradas e joias que desfilam em seus corredores. 

Mas se há uma coisa que é o coração da coroa do programa são o elenco e os personagens secundários. Embora Luís seja o protagonista e Versailles gire em torno de seu governante, em vários momentos outros nomes brilham mais que o rei. Desde seu valete pessoal e super leal, Bontemps (Stuart Bowman), e seu chefe de segurança, Fabian Marchal (Tygh Runyan) até seu irmão, Philippe d’Orleans (Alexander Vlahos), cada plot mostra uma face diferente da série, deles mesmos e do palácio. E o elenco faz um trabalho espetacular ao mostrar isso de tão bem entrosado que é (se não acredita, assiste esse vídeo aqui ó).

Vamos falar sobre Philippe

O irmão do rei e duque de Orleans era abertamente bissexual em uma época em que o nome dessa orientação nem era sonhado. Em uma relação duradoura com Chevalier de Lorraine (Evan Williams), Philippe explora sua sexualidade sem medo. O modo como a série resolve mostrar esse lado do nobre é o melhor ponto da história. Ao invés de ser constante alvo de chacota ou preconceito (como sabemos que poderia ser, infelizmente), Philippe até atrai olhares, mas é muito mais do que sua companhia ou as roupas que veste – como deve ser.

A relação entre os irmãos é um tópico constantemente trabalhado na série. O embate entre ser feliz e seguir as vontades do rei trazem conflitos aos dois e já forneceu cenas poderosas ao público. A amabilidade de Philippe sempre nos lembra que Versailles é uma fachada e que há coisas mais importantes na vida. Ele é um personagem essencial e sua importância é tratada com devido respeito, assim como a necessidade de mostrar que, mesmo naquele tempo, não era nem um pouco menos amado por sua família por ter uma orientação sexual diferente dela. 

Ele é de longe meu personagem favorito na série e merecia um tópico para chamar de seu. 

Bem-vindo a Versailles

Depois de ser cancelada no ano passado, a série demora para chegar nos serviços de streaming, mas já tem duas temporadas disponíveis na Netflix. Seus – por enquanto – vinte episódios de uma hora cada são super maratonáveis e um prato cheio para os amantes de séries históricas. Vale a pena conhecer a história do Rei Sol e seu palácio dos sonhos.

Apaixonada por música, cinema, moda e literatura, história mundial e andar de bicicleta. Sonha em ter muitos carimbos em seu passaporte.

8 Comentários

  • Leonardo Siegfried Cezìno

    Eu gosto muito do Duque d’Orleans, é meu personagem favorito e bem mais elegante e bonito que o irmão. Eu gostaria de saber se existe alguma postagem sobre o que é verdadeiro e ficção na série, pois fico perdido e a me perguntar se alguns acontecimentos e se a própria construção de Versailles foi tão macabra e sangrenta. Gostaria muito de uma postagem que explicasse esmiuçadamente cada temporada sobre os fatos verdadeiros e ficção. Agradeço muito a que me indicar. ; )

  • jaciara

    eu estou tentando me acostumar a ela, é viciante e ao mesmo tempo fico indignada com tantos os acontecimentos, e em pensar que isso foi algo tão real na época, passa filmes na minha cabeça de como algumas coisas não mudaram na politica, corrupção uma delas e tantos outros assuntos presentes no nosso dia a dia que ao longo dos anos mesmo com tanta evolução ainda existem, Versailles é um convite a conhecer a grandiosa historia da nossa humanidade com todas as lastimas, evoluções, que carregamos ao longo dos anos.

  • MARIO

    Estou vendo e achando muito interessante! Realidade e ficção se misturam num enredo de tirar o folego! A reconstituição de época é perfeita, o cenário deslumbrante e os atores super afinados com a história. Vale a pena assistir!

  • Ronaldo

    Estou terminando de ver a série (faltam os dois últimos episódios da 3ª temporada) e cheguei ao seu post pesquisando sobre ela. Gostei bastante da análise, concordo que Philippe seja o personagem mais querido, mantendo sua lealdade ao irmão apesar de tudo. Que você possa colecionar os carimbos que deseja e que possa conhecer o palácio e seus jardins, em especial a queima de fogos noturna que recria os festejos daquela época. Parabéns!

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