Críticas,  Filmes

Crítica | O Estranho que Nós Amávamos (2017)

Como muitas coisas no mundo, alguns diretores de cinema são casos de amor ou ódio. Sofia Coppola, filha do inigualável Francis Ford Coppola (O Poderoso Chefão, Apocalypse Now), parece se encaixar nesses termos. A mente por traz de As Virgens Suicidas e Encontros e Desencontros nem sempre agrada às críticas, mas não é por isso que ela vai deixar de fazer o que ama, não é? Neste ano, ela trouxe seu mais recente trabalho: o remake do filme homônimo de 1971, O Estranho que Nós Amávamos. O drama se passa na Virginia de 1864, em meio a Guerra Civil Americana, e nos apresenta o Internato para Garotas da Srta. Farnsworth, onde menos de meia dúzia de alunas ainda permanecem, além da diretora Martha Farnsworth (Nicole Kidman) e da professora Edwina Morrow (Kirsten Dunst).

Enquanto tentam seguir com suas vidas na escola da melhor maneira possível, um evento inesperado interrompe a aparente paz local. Amy (Oona Laurence), uma das alunas, encontra um soldado inimigo ferido no meio do bosque próximo à propriedade e decide levá-lo de volta à escola para que possa se curar e ser entregue às autoridades militares do seu lado da luta. Cabo John McBurney (Colin Farrell) entra na vida daquelas mulheres para modificá-las completamente. Ao mesmo tempo que lidam com a obrigação de entregá-lo às autoridades, as mulheres sentem as mais variadas reações a sua presença ali, mas acima de tudo a paixão floresce.

Em uma história comum do cinema, quando tal situação ocorre costuma ser uma promessa de uma bonita história de amor. Nesse caso, nem tanto. Todas as mulheres da casa de alguma forma se apaixonam pelo semi convidado. Desde Amy com sua curiosidade e admiração até Edwina com um tímido e forte interesse, cada uma delas faz o título original do filme valer. The Beguiled se traduz em algo como ‘As Cativadas’, mas limitar esse estado às mulheres e ao interesse amoroso é muito superficial. McBurney se vê tão encantado quanto elas ao encontrar naquela escola oportunidades para amar, para o prazer, para viver e, principalmente, fugir da guerra. Elas se fascinam pelo o que ele representaria: a liberdade para fugir dali para Edwina, o amadurecimento para Alicia e a possibilidade de reviver o passado para Martha. E, em termos gerais, a lembrança que elas são mulheres, com desejos e vaidade, além de sobreviventes a uma guerra.

Para sustentar tanto a carga psicológica inicial quanto aos desenvolvimentos desses numerosos e conflitosos interesses, Coppola selecionou um ótimo elenco. Nicole Kidman assume o posto de diretora da escola e nos mostra uma mulher dedicada, com fibra, abraçando a figura materna que lhe é imposta e encarando todas as dificuldades da chegada do cabo com força. Elle Fanning, em seu segundo trabalho com a diretora, deu vida a uma menina mimada, folgada e egoísta que dava raiva de ver. Enquanto Kirsten Dunst tem em Edwina sua terceira parceria com Coppola e uma mulher subordinada e secretamente desesperada por um final feliz. Colin Farrell colabora com esse elenco sensacional conseguindo atingir extremos emocionais de maneira fantástica. E, para fechar, as crianças não são apagadas pelas grandes estrelas. Elas brilham tanto quanto – e talvez até mais em alguns momentos.

A parte técnica do filme não deixa a desejar e se mantém firme a bastante conhecida identidade visual da diretora. O roteiro é bem objetivo, colabora com o fluxo do filme para que ele não se estagne e constrói bem e condiz com as personalidades dos personagens. A fotografia é linda, recheada de tomadas em tom pastel típicas dos filmes da diretora que dão à história um tom de delicadeza que mascara segredos obscuros do enredo. Este, no entanto, pode ficar aquém as expectativas. A história é bem localizada, em um curto período de tempo e tem poucos personagens. O que pode parecer defeito é insignificante graças a tantos outros pontos positivos.

O Estranho que Nós Amávamos é, apesar de seu título traduzido pelos responsáveis das sinopses da Netflix ou da Sessão da Tarde, um ótimo filme e talvez um dos melhores da carreira da diretora. Um drama que colabora na consolidação da qualidade cinematográfica dos filmes de Coppola, que mexe com o espectador sem necessidade de grandes efeitos ou detalhes narrativos, mostrando que um punhado de pessoas – ou até mesmo uma só – fazem uma grande história.

Curiosidade: O filme foi rodado em Madewood Plantation House, na Louisiania, a mesma fazenda que Beyoncé usou como locação do clipe Sorry, na era Lemonade. As atrizes, é claro, não deixaram de brincar com isso durante a gravação, reproduzindo a foto da cantora com a tenista Serena Williams.


Confira o trailer:

 

Apaixonada por música, cinema, moda e literatura, história mundial e andar de bicicleta. Sonha em ter muitos carimbos em seu passaporte.

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