Literatura

Quem é Kazuo Ishiguro, o novo Nobel de Literatura

Meu primeiro contato e por enquanto único com a obra de Kazuo Ishiguro veio através do filme Não Me Abandone Jamais, adaptação de seu romance de 2005 de mesmo nome. Ali, naquela história em outra mídia já era possível ver que a criatividade, a imaginação e o poder de impacto do autor era algo impressionante. Por isso, não foi uma surpresa para mim que o escritor japonês de 62 anos tenha sido laureado com o Nobel de Literatura neste ano.

Kazuo Ishiguro nasceu no Japão e migrou com sua família para a Inglaterra quando tinha somente seis anos. Ele acabou crescendo em um ambiente bicultural, se arriscou em uma carreira musical, mas acabou migrando para a literatura. Até ter sucesso com seus romances, Ishiguro escreveu muitos contos e artigos na década de 80. Em 1989, levou o Prêmio Booker, um dos maiores prêmios da literatura de língua inglesa, por Os Vestígios dos Dias. Aqui no Brasil, seus livros são publicados pela Companhia das Letras – e tem edições recentes muito lindas e harmonizadas – e já podemos encontrar Não Me Abandone Jamais, Os Vestígios dos Dias, Noturnos, Quando Éramos Órfãos e O Gigante Enterrado, este sendo o último romance publicado até agora.

Os Livros

Não Me Abandone Jamais – Kathy H. tem 31 anos e está prestes a encerrar sua carreira de “cuidadora”. Enquanto isso, ela relembra o tempo que passou em Hailsham, um internato inglês que dá grande ênfase às atividades artísticas e conta, entre várias outras amenidades, com bosques, um lago povoado de marrecos, uma horta e gramados impecavelmente aparados. No entanto esse internato idílico esconde uma terrível verdade: todos os “alunos” de Hailsham são clones, produzidos com a única finalidade de servir de peças de reposição. Assim que atingirem a idade adulta, e depois de cumprido um período como cuidadores, todos terão o mesmo destino – doar seus órgãos até “concluir”. Embora à primeira vista pareça pertencer ao terreno da ficção científica, o livro de Ishiguro lança mão desses “doadores”, em tudo e por tudo idênticos a nós, para falar da existência. Pela voz ingênua e contida de Kathy, somos conduzidos até o terreno pantanoso da solidão e da desilusão onde, vez por outra, nos sentimos prestes a atolar. | Compre aqui 

Os Vestígios do Dia – Neste livro do ganhador do prêmio Nobel de Literatura de 2017, o mordomo Stevens, já próximo da velhice, rememora as três décadas dedicadas à casa de um distinto nobre britânico, lord Darlington, hoje ocupada por um milionário norte-americano. Por insistência do novo patrão, Stevens sai de férias em viagem pelo interior da Inglaterra. O mordomo vai ao encontro de miss Kenton, antiga companheira de trabalho, hoje mrs. Benn. No caminho, recorda passagens da vida de lord Darlington e reflete sobre o papel dos mordomos na história britânica. Num estilo contido, o narrador-protagonista acaba por revelar aspectos sombrios da trajetória política do ex-patrão, simpatizante do nazismo, ao mesmo tempo que deixa escapar sentimentos pessoais em relação a miss Kenton, reprimidos durante anos. | Compre aqui

O Gigante Enterrado – Uma terra marcada por guerras recentes e amaldiçoada por uma misteriosa névoa do esquecimento. Uma população desnorteada diante de ameaças múltiplas. Um casal que parte numa jornada em busca do filho e no caminho terá seu amor posto à prova – será nosso sentimento forte o bastante quando já não há reminiscências da história que nos une? Épico arturiano, o primeiro romance de Kazuo Ishiguro em uma década envereda pela fantasia e se aproxima do universo de George R. R. Martin e Tolkien, comprovando a capacidade do autor de se reinventar a cada obra. Entre a aventura fantástica e o lirismo, O gigante enterrado fala de alguns dos temas mais caros à humanidade: o amor, a guerra e a memória. | Compre aqui

Noturnos – Nesta reunião de cinco narrativas, Kazuo Ishiguro deixa de lado a solenidade distendida dos romances para dedicar-se à concisão, à leveza e ao humor concentrado do gênero curto. Noturnos traz contos sobre instrumentistas e amantes da música, de diversas partes do mundo. Tony Gardner, um velho crooner americano, já não desfruta do mesmo prestígio, mas para o jovem músico Jan ele ainda é um ícone. O consagrado cantor o surpreende ao convidá-lo para uma parceria inusitada. Um professor de inglês que vive na Espanha, amante dos standards americanos, vai a Londres visitar um casal de amigos, e se descobre numa roda-viva de ressentimentos e neuroses. Na mesma cidade, um músico procura emprego em uma banda, mas decide recuperar a inspiração nas colinas britânicas. Um saxofonista competente se rende à ideia de fazer uma plástica facial em Beverly Hills para entrar para o primeiro time da música. Um violoncelista húngaro procura se estabelecer na Itália, mas acaba seduzido por uma viajante americana. Nestas histórias, emoções suscitadas por belas melodias convivem com as limitações do mundo da música. Se o poder de tocar o sentimento faz dos músicos seres próximos da genialidade, as exigências do senso comum e da profissionalização os submetem a situações muitas vezes patéticas e hilariantes. | Compre o ebook aqui

Quando Éramos Órfãos – Quando éramos órfãos marca a volta de Kazuo Ishiguro à ficção, depois de um silêncio de cinco anos. Com sutileza temperada por um humor fino e certeiro, o autor de Os vestígios do dia escreve sobre o poder do passado de determinar, para o bem ou para o mal, o presente das pessoas. Christopher Banks, um garoto inglês nascido na Xangai do início do século, fica órfão aos nove anos de idade, quando seus pais desaparecem misteriosamente. De volta à Inglaterra, torna-se um detetive de renome e circula nos meios mais refinados. Vinte anos depois, Banks resolve rever Xangai – agora palco da guerra sangrenta entre China e Japão. A partir desse momento, sua busca pelos pais passa a confundir-se com a busca pela ordem num mundo órfão, vitimado pela sombra.Envolvente, a narrativa ganha ritmo de trama policial na voz controlada e minuciosa do protagonista. A aparente frieza do relato, entretanto, não esconde o que Christopher Banks não quer ou não pode ver: que sua memória, sua visão de mundo, não estão imunes às tragédias da infância. No vaivém das reminiscências, o lirismo colide dolorosamente com a matéria dura da realidade.

O Filme

Não Me Abandone Jamais ganhou uma adaptação em 2011, que contava com Carey Muligan, Andrew Garfield e Keira Knightley nos papéis dos estudantes clones protagonistas e foi dirigido por Mark Romanek. Assim como o livro parece ser, o filme possui uma carga dramática intensa, com um ótimo trabalho tanto do elenco quanto direção e toda parte técnica. Vale a pena assistir.

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Por enquanto, pelo menos, Noturnos e Quando Éramos Órfãos estão esgotados na Companhia das Letras, mas eles e inclusive outros livros do autor publicados por outras editoras em edições mais antigas podem ser encontradas em sebos virtuais.

Fiquei mais empolgada em tirar o meu Gigante Enterrado da estante com a notícia do Nobel da Literatura. E vocês? Já conheciam o autor?

Apaixonada por música, cinema, moda e literatura, história mundial e andar de bicicleta. Sonha em ter muitos carimbos em seu passaporte.

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